Vox

Christina Dalcher

Editora: Arqueiro

Páginas: 320

Ano: 2018

Publicado em: 08/11/2018

Sinopse:

Uma distopia atual, próxima dos dias de hoje, sobre empoderamento e luta feminina. O governo decreta que as mulheres só podem falar 100 palavras por dia. A Dra. Jean McClellan está em negação. Ela não acredita que isso esteja acontecendo de verdade. Esse é só o começo... Em pouco tempo, as mulheres também são impedidas de trabalhar e os professores não ensinam mais as meninas a ler e escrever. Antes, cada pessoa falava em média 16 mil palavras por dia, mas agora as mulheres só têm 100 palavras para se fazer ouvir. ...mas não é o fim. Lutando por si mesma, sua filha e todas as mulheres silenciadas, Jean vai reivindicar sua voz.

“- Vocês não fazem ideia, senhoritas. Absolutamente nenhuma ideia. Estamos a um passo de voltar à pré-história, meninas. Pensem nisso. Pensem onde vocês vão estar, onde suas filhas vão estar, quando os tribunais atrasarem os relógios. Pensem em expressões como “permissão do cônjuge” e “consentimento paterno”. Pensem em acordar um dia e descobrir que não tem voz em nada.” (p. 16)

Olá meu caro leitor, como tem passado? Está se lembrando que agora minhas resenhas possuem um novo formato? Se quiser saber mais sobre a história além das minhas considerações, dê uma olhadinha na sinopse aqui na parte amarela logo acima.

Recentemente eu li O Conto da Aia e me encantei profundamente pela história. Quando a Arqueiro anunciou o lançamento de Vox como um reconto amedrontador dessa história, mas nos dias atuais, eu fiquei extremamente ansiosa para ter esse livro em mãos logo. Trazendo em voga a luta do feminismo contemporâneo, e o poder que as palavras possuem, a história toca em um dos pontos mais fortes da nossa sociedade: a igualdade de gêneros.

“- Estou falando sério. – Jackie apontou uma unha roxa para mim. – Espere só. Daqui alguns anos vai ser um mundo diferente se a gente não fizer alguma coisa. Expansão do Cinturão da Bíblia, uma representação de bosta no Congresso e um bando de garotinhos famintos por poder que estão cansados de ouvir dizer que precisam ser mais sensíveis. – Então ela deu um riso maligno que sacudiu todo o seu corpo. – E não pense que serão todos homens. As recatadas do lar vão estar do lado deles.” (p. 25)

Igualdade de gêneros significa que homens e mulheres devem ter os mesmos direitos e deveres. Em teoria isso é maravilhoso correto? Mas na pratica infelizmente ainda é algo utópico. E no livro vemos claramente a subordinação obrigatória das mulheres aos homens.

“Você pode tirar muitas coisas de uma pessoa: dinheiro, emprego, estímulo intelectual, qualquer coisa. Pode tirar ate suas palavras, mas isso não vai mudar sua essência.” (p. 36)

Em Vox as mulheres sofrem quase o mesmo destino das do Conto da Aia, não podem mais trabalhar fora, ter conta em bancos, contato com livros, celulares e afins e possuírem autonomia sobre si próprias. Essa realidade descrita no livro me gera uma revolta enorme, mesmo a história sendo fictícia e se passando nos Estados Unidos, eu me perguntava o tempo inteiro: o que seria de nós mulheres aqui no Brasil vivendo algo assim?

“Estou me sentindo igual ao Cartman naquele filme do South Park, quando implantam um chip em sua cabeça que lhe dá um choque sempre que ele diz “porra” – como é South Park, isso acontece o tempo todo.” (p. 84)

Jean, a personagem principal, é maravilhosa. Amei sua ironia ao longo da narrativa e a força dela em lutar por aquilo que acredita, mesmo que seja da sua maneira. Confesso que em algumas partes da história eu quis sacudir a Jean para ela deixar de ser passional e agir mais, porem compreendi que a situação das mulheres no livro, não abria brechas para que nenhuma delas, nem mesmo Jean, conseguisse fazer algo maior do que queriam.

“Talvez tenha sido isso o que aconteceu na Alemanha com os nazistas, na Bósnia com os sérvios, em Ruanda com os hutus. Às vezes eu refletia sobre isso, sobre como crianças podem se transformar em monstros.” (p. 102)

Esse é um livro forte, a ideia de contadores de palavras me aterrorizou profundamente. Eu que falo o dia inteiro, converso sozinha, com o peixe, os cachorros e canto minhas versões das musicas que amo, não suportaria ter apenas 100 palavras diárias para falar.

“- Há uma resistência?

O mundo parece doce quando digo isso.

– Querida, sempre há uma resistência. Você não cursou faculdade?” (p. 161)

Os plot twists que acontecem na história me deixaram de queixo caído, afinal, quem não ama uma boa reviravolta? Mas eu jamais esperaria as coisas que aconteceram, isso sim foi um ponto extremamente positivo na narrativa.

“Os monstros não nascem assim, nunca. Eles são feitos, pedaço por pedaço e membro por membro, criações artificiais de loucos que, como o equivocado Dr. Frankenstein, sempre acham que sabem mais.” (p. 211)

E por falar em narrativa, me encantei pela escrita da Christina Dalcher e pela ousadia dela em recriar uma versão contemporânea de um dos maiores clássicos da literatura. Recomendo esse livro com o coração aberto e livre. E obrigada a Editora Arqueiro por investir nessa história, vocês arrasaram.

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