Sinopse:
Andrea sabe tudo sobre sua mãe, Laura. Ela sabe que Laura sempre viveu na pequena cidade costeira de Belle Isle; sabe que a mãe nunca desejou nada além de uma vida serena como integrante da comunidade; e sabe que ela jamais guardou um segredo na vida. Afinal, todos conhecemos nossas mães, certo? Mas tudo muda quando uma ida ao shopping se transforma em um cenário de violência e caos, e Andrea conhece um lado completamente novo de Laura. Parece que sua mãe, antes de ser Laura, era outra pessoa. Durante quase trinta anos ela escondeu sua identidade, vivendo sossegadamente na esperança de que ninguém descobrisse quem era de verdade. Agora, exposta, nunca mais poderá viver como antes. A polícia quer respostas e a inocência de Laura está em jogo, mas ela se recusa a falar com quem quer que seja, inclusive com a própria filha.
Achei que estava preparada para o que eventualmente enfrentaria durante a leitura, mas me enganei. Conheço as histórias de Karin Slaughter e gosto muito, apesar dos temas pesados e de leitura difícil que, normalmente, não conquistam todo tipo de leitor. Neste livro, a autora apresenta um lado seu, até então, desconhecido para mim. Para ler essa história de altos e baixos, foi preciso esquecer Flores Partidas, uma de suas obras mais famosas, e reduzir toda a expectativa de que o ritmo e a adrenalina seriam iguais. Aqui a leitura precisa de esforço, mas a recompensa final é incrível e emocionante.
O livro começa em ritmo frenético. Andrea e a mãe, Laura, estão almoçando no restaurante de um shopping para comemorar seus trinta e um anos, quando um atirador invade e abre fogo contra as pessoas. Completamente desesperadas, elas tentam fugir, mas quando o atirador avança em direção a Andy, Laura o enfrenta, consegue desarmá-lo e rasga sua garganta. Com uma precisão serenidade e quase cirúrgicas.
As coisas se agravam quando Laura simplesmente se recusa a dar explicações sobre o ocorrido, pede que a filha esqueça tudo e que vá embora. Essa reviravolta faz Andrea perder o próprio norte, essa mulher não se parece com sua mãe, tampouco a que assassinou um homem a sangue frio no shopping. Como poderia uma mulher como Laura matar alguém com tamanha frieza e requinte?
Alerto que esta é uma leitura pesada, por vezes indigesta, com descrições gráficas de violência e assuntos polêmicos, como abusos físicos e emocionais que podem provocar gatilhos em alguns leitores.
“Onde sua mãe havia aprendido a usar uma faca daquele modo? Laura nunca estivera nas forças armadas. Pelo que Andy sabia, nunca tivera aulas de defesa pessoal.”
Aflita e aterrorizada com a situação, Andrea parte numa fuga investigativa, sem saber exatamente como fazer isso. Ela só quer entender. Interceptar o assassino foi um ato heroico de sua mãe ou isso significa que Laura é uma assassina? Como ela poderia ser? A essa altura, as certezas de Andy são muito frágeis, inclusive a confiança de que essa busca lhe trará as respostas de que precisa.
A história apresenta duas protagonistas complexas. Laura tem 55 anos, é uma mulher muito elegante e centrada que carrega consigo uma consolidada carreira como fonoaudióloga. Ela é querida pelos seus pacientes e acabou de passar por um longo tratamento contra um câncer de mama. Vivendo numa cidade do interior, convivendo pacificamente com o ex-marido, aparenta ser alguém extremamente comum e acima de suspeitas. Já sua filha está com problemas. Andrea é uma aspirante a atriz de 31 anos bastante insegura e muito dependente, ela não tem dinheiro, emprego ou perspectivas. Largou a vida em Nova York que já não estava dando certo para cuidar da mãe durante o tratamento de câncer e não sabe muito bem o que fazer agora.
Essas duas mulheres tão diferentes constroem jornadas de amadurecimento incríveis, ainda que precisem de muitas páginas para tanto, principalmente Andrea. O amadurecimento dela é muito real. É difícil e sofrido lidar com descobertas tão sombrias sobre a mãe.
Toda essa ação e adrenalina inicial cria a falsa ideia de que a história se manterá acelerada. Não é o que acontece e um dos maiores problemas do livro é esse. A fuga de Andrea desacelera completamente a história. As descobertas são lentas, seu processo de assimilação também. Os flashbacks também criam muitas quebras de ritmo. Somado a isso, há capítulos longos e descritivos que tratam de temas muito polêmicos e isso me fez interromper a leitura algumas vezes.
Minhas emoções ao longo do livro oscilaram muito. O início é empolgante, mas foi difícil levar a leitura até o final da sua primeira metade. Me exigiu um pouco de persistência. Além disso, viajar aos anos oitenta para entender a história de um grupo idealista foi bem cansativo. Essas voltas ao passado ajudam a explicar e encaixar muitos pontos do enredo. Nesse tempo, a autora destrincha um tema muito polêmico e, apesar de ter gostado da forma com que foi conduzido, achei indigesto.
A narração em terceira pessoa é bem ao estilo Karin Slaughter, potente, de um realismo cruel e muito detalhista.
“Sempre que Andy achava que alguma coisa fazia sentido, o mundo saía do eixo de novo.”
Ninguém pode saber é uma história sobre força feminina. Sobre mulheres descobrindo sua própria força em momentos de desespero e, essencialmente, sobre amor. Um amor incondicional e transformador, capaz de encorajar nos momentos mais sombrios. Ao mesmo tempo faz algumas críticas sociais, às abordagens policiais e também trata de relacionamentos abusivos. Uma mistura que, em geral, funciona muito bem.
“Tenho muito orgulho de você, meu anjo. Os últimos 31 anos foram uma benção. Você é a razão pela qual estou viva. Nunca teria conseguido sem você. Você me entende? Você é meu coração. Você é cada gota de sangue no meu corpo.”
Esse não é um típico thriller em que a ação e o suspense dão o tom. Na verdade, o considero um drama familiar visceral com suspense. Talvez, ao final, alguma das revelações sejam um pouco previsíveis ou não mostrem muito contexto, mas compensa muito chegar ao capítulo. Aliás, o final foi a minha parte favorita. O epílogo é arrasador no melhor dos sentidos: tenso e emocionante! Recomendadíssimo para fãs de thrillers que buscam algo diferente do habitual.
“Laura sempre acreditava – veemente e com grande convicção – que a única forma de mudar o mundo era destruí-lo.”
Sigo admirando ainda mais a autora, principalmente agora que sei que ela é capaz de me deixar com os olhos cheios de lágrimas no final de uma leitura tão sombria e impactante.